Segurança Rodoviária dentro das localidades – peões
A Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR), lançou recentemente o “Anuário de Segurança Rodoviária” relativo ao triénio 2010-2012. Trata-se de uma compilação de dados estatísticos que refletem o “estado” da sinistralidade ocorrida no nosso país durante aquele período.
Na verdade, só conhecendo as causas e os efeitos da sinistralidade que ocorre nas vias de comunicação se poderá criar políticas verdadeiramente corretas e direcionadas no combate àquele fenómeno, sendo certo que só assim se conseguirá dirimir os enormes custos humanos, económicos e sociais que lhe estão associados.
Ao falarmos de sinistralidade rodoviária, falamos essencialmente da vida e da saúde dos cidadãos, sendo que, nunca nos poderemos dar por satisfeitos mesmo com reduções relevantes como aquelas que têm ocorrido nos últimos anos, ou não fosse Portugal um país da União Europeia, onde se registam os melhores resultados a nível mundial.
O anuário procede à análise da informação referente àqueles anos, tendo a mesma sido recolhida e tratada pelo Observatório de Segurança Rodoviária da ANSR a partir dos Boletins Estatísticos de Acidentes de Viação (BEAV) e completada com a consulta a diferentes bases de dados devidamente identificadas, encontrando-se refletida em cinco capítulos. Contudo, e por se tratar de muita informação, e não sendo este o espaço mais adequado a uma longa exposição, concentremo-nos em alguns dos factos mais relevantes, relativamente à ocorrência de acidentes. Noutros artigos a publicar incidiremos em outros fatores, designadamente, fator humano, fator infraestrutura e fator veículo.
Assim, de acordo com a informação constante no documento, verifica-se que só no ano de 2012 registaram-se em Portugal 29.867 acidentes com vítimas, o que se traduziu numa redução de 15,7% face ao ano de 2010, ou seja, menos 5.559 acidentes.
Em termos de distribuição temporal podemos constatar que a maioria dos acidentes ocorre nos meses de verão. Um dado “curioso” é que os acidentes acontecem mais às sextas-feiras, sendo contudo mais graves (com maior número de vítimas mortais) aos fins de semana. O pico dos acidentes observou-se entre as 15:00 e as 18:00, sendo que, entre as 18:00 e as 21:00 se registaram o maior número de vítimas mortais e feridos graves e é dentro das localidades que se verificam o maior número de acidentes (75%). Ora em 2012, 57% dos acidentes com vítimas mortais ocorreram no interior das localidades.
Ao contrário daquilo que muitos pensam, morre-se mais dentro das localidades, especialmente em arruamentos, do que em estrada ou autoestrada. Só para se ficar com uma ideia mais aproximada desta realidade, importa destacar o facto de se terem registado 2.489 acidentes por mês o que dá uma média diária de 82, ou seja, cerca de 3 acidentes por hora. Podemos estatisticamente afirmar que a cada 20 minutos ocorre um acidente, sendo que a percentagem de acidentes dentro das cidades tem vindo a aumentar especialmente nos arruamentos.
Pelo atrás exposto, verificamos que as localidades são muito sensíveis ao fenómeno da sinistralidade rodoviária e, neste sentido, há que apostar de forma muito incisiva em políticas devidamente orientadas e “calibradas” para reduzir a sinistralidade aí verificada.
De entre as inúmeras formas de o fazer, contínuo, pessoalmente, a defender a existência de uma mobilidade urbana mais “inteligente” e amiga do ambiente, ou seja, uma rede de transportes públicos verdadeiramente orientada para os cidadãos, servindo com amplitude as grandes urbes e evitando assim o uso e recurso continuado do automóvel particular. Numa altura em que as dificuldades económicas são cada vez maiores, há que encontrar soluções alternativas e o uso do transporte público é certamente uma das mais adequadas. Ao nível das localidades, cabe a quem gere o espaço público tomar medidas que impliquem novos comportamentos por parte dos condutores, mas também, de condições e/ou medidas que permitam a proteção dos peões.
Neste contexto, é primordial promover e valorizar as normas e práticas utilizadas nas auditorias de segurança rodoviária, bem como as inspeções às vias, e consequentemente, promover uma melhor utilização da via pública na ótica da circulação pedonal, nomeadamente pela criação de trajetos pedonais onde se conjugue o encurtamento das distâncias com a segurança do tráfego de peões. Contudo, para o fazer torna-se necessário formar um conjunto de técnicos das autarquias, através de cursos específicos e orientados para a gestão da segurança do trânsito.
Fomentar a adoção de zonas de velocidade reduzida a 30 e/ou 20 km/h, em locais habitualmente frequentados por peões, com particular destaque para zonas de concentração de crianças e jovens (escolas em especial) é de especial importância também, bem como proceder ao inventário das bermas e passeios degradados, promovendo a sua reparação de forma a evitar a circulação na faixa de rodagem onde ocorre um número muito elevado de acidentes com gravidade.
Considero também crítico não só promover o desvio do trânsito de passagem para o exterior reduzindo as velocidades praticadas através de técnicas de acalmia de tráfego, mas também estabelecer e impulsionar normas mais adequadas de iluminação para os locais frequentemente utilizados por peões. Só com a aplicação destas e outras medidas, poderemos otimizar o ambiente rodoviário defendendo a circulação segura dos peões, em especial no interior das localidades.
Diogo Júdice
ANSR