TAG Heuer Monaco: mito ao quadrado
Actualmente, tanto no mundo da relojoaria como no universo automóvel e em muitas outras áreas, tem-se verificado uma curiosa febre de reedições e reinterpretações – com um passado glorioso a inspirar produtos adaptados às novas exigências e de qualidade contemporânea. Até porque não é nada barato manter um Jaguar E-Type original ou fazer revisões periódicas a um cronógrafo Carrera de 1963, com recordes a serem estabelecidos no mercado de leilões de clássicos… mas esse é mais para os endinheirados.
Hoje em dia, quem queira um produto de culto e com história a um preço ‘normal’ pode aproveitar a tendência do new-vintage para adquirir uma reinterpretação ou uma reedição. Na relojoaria, a moda do neo-retro tem vindo a tornar-se relevante e ultimamente até tem incidido muito sobre os Anos 1970 – a década que se pensava ser a que personificava o mau gosto até que, com algum recuo, se verificou que a de Oitenta foi mesmo a pior.
A TAG Heuer foi a pioneira no lançamento de emblemáticos modelos do passado com o advento dos cronógrafos Carrera em 1996 e Monaco em 1998; depois lançou várias outras reedições/reinterpretações (Autavia, Silverstone, Monza, etc), mas o Carrera e o Monaco tornaram-se traves mestras da sua colecção e transformaram-se em linhas incontornáveis do seu catálogo. E o Monaco assume um papel muito especial na história da marca graças à sua geometria e ligação cinematográfica.
O Monaco original foi lançado em 1969 mas já estava dotado de ângulos e cores que deixavam antever o estilo relojoeiro que marcou a década de 1970 e a era ‘disco’. O nome foi criteriosamente escolhido por Jack Heuer para evocar a famosa prova de Fórmula Um, o glamour do Principado, o estilo de vida do jet-set da Côte d’Azur. E não há dúvida de que estabeleceu um marco na história da relojoaria: exibia então um dos dois primeiros mecanismos cronográficos automáticos (o Calibre 11 modular, vulgo ‘Chronomatic’, foi apresentado escassos dias após o ‘El Primero’) naquele que era considerado o primeiro relógio quadrado à prova de água. Para além disso, o seu original perfil ficou imortalizado no filme ‘Le Mans’ (1971) através do mítico Steve McQueen – um dos defuntos com mais carisma que se conhecem. Jo Siffert, o malogrado piloto suíço que no início dos anos 1970 era um dos protagonistas da Fórmula Um e que foi o primeiro embaixador da marca relojoeira então liderada por Jack Heuer, usava o Monaco; McQueen era um fã de Siffert e recebeu instruções dele para dar maior credibilidade à sua personagem no filme, pelo que ‘Michael Delaney’ também usou o Monaco no pulso. Por volta dos 24 minutos do filme, segura no seu capacete e o relógio torna-se bem visível aos olhos do espectador…
Esse momento acabaria por ficar para a posteridade sob várias formas. Uma das quais a ‘reciclagem’ do estranho relógio quadrado, colocado de novo no mercado em 1998 numa edição limitada a 5.000 exemplares.
As proporções, o mostrador e os botões do neo-Monaco de 1998 eram assaz diferentes do original e davam-lhe uma personalidade muito mais… urbana. Muito por causa de um mostrador totalmente preto. A coroa do modelo de 1969 estava do lado direito da caixa devido ao mecanismo, enquanto na nova versão ficou colocada ortodoxamente entre os botões cronográficos do lado direito da caixa. A própria caixa foi remodelada, com alternâncias entre aço baço e polido, as arestas foram limadas, e os pequenos segundos e o contador dos minutos eram da mesma cor do fundo negro do mostrador…
O sucesso dessa reinterpretação livre de um relógio tão peculiar como o Monaco incentivou a TAG Heuer a investir noutras versões. E, claro, numa versão mais próxima da mais conhecida e mais racing de todas as variantes do cronógrafo quadrilátero lançadas entre 1969 e o final da década de Setenta: a tal que Steve McQueen utilizou, de mostrador azul metalizado com contadores brancos e alguns ponteiros vermelhos. Tem havido muitas reinterpretações do Monaco lançadas pela TAG Heuer nos últimos 15 anos, incluindo variantes mais estilizadas e mesmo concept watches que se tornaram realidade comercial (o Monaco V4), mas o Monaco Steve McQueen mantém-se como a mais famosa e reconhecível.
Em 2009, para comemorar os 40 anos do Monaco, foi mesmo concebida uma edição limitada muito fiel ao original desse ano, com coroa à esquerda e mostrador de tons mais aproximados. Só que o modelo mais popular e acessível mantém-se o de mostrador de intenso azul metalizado que sob o sol se torna ainda mais espectacular. E que há cinco anos foi actualizado/melhorado, passando a ser dotado de fundo transparente (para se poder admirar o movimento automático) e de um vidro de safira anti-risco (em vez do plexiglass mais frágil). Em suma: um relógio de grande carisma que atravessou o teste dos tempos e perpetuou um mito, tendo antecipado tanto a moda das reedições como a actual tendência para mostradores azuis. Ah, e que não fica só bem no enquadramento de um autódromo – também é um excelente relógio de verão!
Miguel Seabra
Espiral do Tempo