Segurança Ativa Automóvel
No meu último artigo de opinião debrucei-me sobre a importância da segurança passiva automóvel, tendo estabelecido a relação existente entre a evolução dos vários sistemas de segurança que têm vindo a ser desenvolvidos ao longo das últimas décadas e a melhoria da segurança rodoviária. Aproveitei para dar um especial enfoque na sua importância para a redução do drama que é a sinistralidade rodoviária e alertei para o facto de se dever atender para as características de segurança dos veículos aquando da sua aquisição.
Na altura referi o facto de muitos dos sistemas de segurança passiva serem ainda (infelizmente) encarados como um opcional, mas a realidade é que grande parte dos dispositivos que há uma ou duas décadas atrás eram vistos como “luxos”, hoje estão amplamente disseminados pela indústria automóvel.
A segurança passiva consiste pois num conjunto de dispositivos que atuam de forma direta na proteção dos ocupantes em caso de acidente (airbags frontais, laterais, de cortina, de joelho, zonas de deformação programada, cintos de segurança com pretensores, encostos de cabeça reguláveis, barras protetoras na zona das portas, entre outros).
Como também tive oportunidade de referir no artigo anterior, hoje a segurança é encarada como o principal desígnio da indústria automóvel, sendo que, por essa razão, são investidos anualmente milhões de euros em investigação, desenvolvimento e conceção de novos e mais avançados produtos, afinal a segurança é também fator preponderante de vendas e, conscientes dessa realidade, as construtoras apostam fortemente nesta área. Mas focar-nos-emos na segurança ativa e em alguns dos inúmeros dispositivos existentes!
Começaria por dizer que a segurança ativa, ao contrário da segurança passiva, é aquela que diretamente respeita à prevenção do acidente, ou seja, ela é composta por todo um múltiplo conjunto de dispositivos mecânicos e eletrónicos que atuam a montante do acidente, ou seja, de forma preventiva, evitando que aquele ocorra.
Na verdade, já há muito que o veículo automóvel é produto do avanço tecnológico, espelhando por si próprio, a evolução constante e progressiva de inúmeras soluções tecnológicas tendentes ao incremento da segurança rodoviária.
Assim, desde os primórdios da industrialização automóvel, que a questão da segurança ativa está presente em todos os produtos desenvolvidos. Afinal o veículo desloca-se por força proporcionada pelos motores, atingindo por efeito dessa mesma força, velocidades muito superiores àquelas que eram próprias dos veículos de tração animal.
As capacidades dinâmicas surgidas com o advento do automóvel nos finais do século XIX, designadamente as velocidades atingidas, teriam de ser também compensadas por dispositivos mecânicos de controlo, tais como direções, suspensões e travões capazes de controlar os novos desempenhos dinâmicos alcançados pelos veículos de então.
Com a evolução do automóvel e, consequentemente, com prestações cada vez maiores, os “dispositivos de controlo” dinâmico foram também evoluindo de forma proporcional, alcançando-se assim níveis cada vez maiores de segurança.
Se a principio a segurança não era encarada como uma prioridade da indústria automóvel, com o passar dos tempos, a mesma passou a ser vista de forma diferente. A verdade é que atualmente e no que respeita à segurança ativa, componentes existentes como os sistemas de travagem, pneus, suspensões, visibilidade, aerodinâmica do veículo, ergonomia, iluminação, entre outros, são determinantes para uma condução em conforto e segurança.
De acordo com o “Livro Branco 2011 – Roteiro do espaço único europeu dos transportes – Rumo a um sistema de transportes competitivo e económico em recursos” reforça-se a necessidade premente de se reforçar a ação no domínio da segurança dos transportes por forma a salvar milhares de vidas, destacando-se a questão da segurança rodoviária, onde deverá ser dada especial importância à harmonização e disseminação das tecnologias de segurança rodoviária – por exemplo, nos sistemas de apoio ao condutor, limitadores (inteligentes) de velocidade, dispositivos de advertência para a colocação do cinto de segurança, sistemas automáticos de chamada de emergência (eCALL), sistemas cooperativos e interfaces veículo/infraestrutura.
Dos vários sistemas de segurança ativa, destaco a importância dada pela “vulgarização” do sistema de travagem antibloqueio (ABS) que se tornou num dispositivo obrigatório em comercialização para todos os carros da União Europeia.
Este dispositivo lançado em 1978 para a indústria automóvel é de grande utilidade, por evitar que as rodas bloqueiem quando o pedal do travão é acionado com força, evitando a entrada em derrapagem, e deixando o automóvel com aderência à estrada.
Evita-se assim o descontrolo do veículo, permitindo que o condutor se desvie dos obstáculos enquanto trava e aproveitando-se de forma mais eficiente o atrito estático (aquele que existe quando há aderência da roda ao piso), que por sua vez é maior que o atrito cinético (o que existe quando há derrapagem, ou seja por deslizamento).
Na realidade, continua-se a verificar que a derrapagem é causa de muitos acidentes, alguns dos quais com repercussões graves.
O facto de o ABS proporcionar um controlo direcional do veículo de forma mais eficaz, reduzindo a distância de travagem, especialmente em situação de baixo coeficiente de atrito (piso molhado ou escorregadio) e consequentemente de reduzir a energia do embate por redução da velocidade em caso de acidente, ainda assim, nem sempre o sistema ABS evita o acidente.
É verdade que os sistemas de travagem têm vindo a evoluir de forma exponencial, e exemplo dessa evolução encontramos nos sistemas de travagem complementares, tais como o BAS (assistência à travagem), mas também no EBD (distribuição da força de travagem) e ainda no EBS (sistema de travagem elétrico). Também os sistemas de controlo de tração têm vindo a evoluir, operando em sintonia com o ABS e os outros sistemas de travagem complementares.
Mas o que mais destacaria é o novo sistema de controlo da estabilidade (ESP) que, entre outras vantagens, proporciona a correção da trajetória e a derrapagem de um veículo, especialmente em curva, melhorando a estabilidade dinâmica do mesmo.
O princípio de funcionamento é baseado em sensores que medem as acelerações angulares e a posição do volante. Assim, e uma vez detetadas discrepâncias na dinâmica do veículo, o sistema atua prontamente em cada roda, travando-a de forma a anular a guinada e provocando a desejada rotação (em caso de subviragem) ou recuperando a desejada estabilidade rotacional (em caso de sobreviragem).
Este sistema segundo estudos efetuados poderá proporcionar a redução até 35% de fatalidades rodoviárias e por essa razão o EuroNCAP, desde 2009, que também tem vindo a testar veículos equipados com estes sistemas de segurança ativa.
Por essa razão o Regulamento (CE) nº 661/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Julho de 2009 relativo às prescrições para homologação no que se refere à segurança geral dos veículos a motor, determinou a obrigatoriedade da incorporação do ESP em todos os veículos produzidos a partir de 1 de novembro de 2014. Com a simples adaptação destas medidas, reduzir-se-á as fatalidades em cerca de 5.000 vítimas mortais por ano.
Dito isto e apesar da panóplia de sistemas de ajuda à condução, o condutor nunca deve cometer o erro de confiar em demasia em tais sistemas de segurança, pois se eles são uma preciosa ajuda à condução, ainda assim não são miraculosos.
As leis da física continuam a imperar por mais sofisticado que o veículo seja e é por essa razão que continuamos a assistir diariamente a acidentes com automóveis de grande cilindrada e sofisticação tecnológica.
O pilar da segurança rodoviária, por excelência, continua a ser, em minha opinião, o do comportamento humano, sendo que o do veículo e infraestrutura apenas o complementam. Por essa razão falarei num próximo artigo sobre comportamento humano e a sua importância decisiva e crítica para a segurança rodoviária.
Diogo Júdice
Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária