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O novo Código da Estrada e os ciclistas

Artigo
O novo Código da Estrada e os ciclistas

Com o novo Código da Estrada (CE) que entrou em vigor a 1 de janeiro de 2014, foram introduzidas algumas importantes alterações quanto à circulação rodoviária e aos seus “atores”. Algumas delas são relativas aos velocípedes (as chamadas bicicletas) que são considerados veículos para todos os efeitos do CE e também “utilizadores vulneráveis” das vias. Temos, portanto, no meio do asfalto e dos motores, um novo elemento perante o qual, de acordo com o artigo 18º nº 3 do CE, os automobilistas devem ter cuidados especiais e são obrigados a manter uma distância lateral de segurança de pelo menos 1,5 metros, mantendo essa distância em caso de ultrapassagem. São considerados utilizadores vulneráveis, por serem os utentes mais frágeis na via em caso de embate/colisão e estarem mais expostos às condições climatéricas, às da via e dos outros veículos.

Já é comum circularmos em Estradas Nacionais, por exemplo, e observarmos ciclistas a ocupar a via de trânsito mais à direita ou até mesmo a zona mais à direita de uma qualquer via de trânsito Na ótica da Polícia de Segurança Pública (PSP), a intenção do legislador é democratizar o uso das bicicletas fazendo-as coabitar em vias com veículos a motor e tendo igualmente uma preocupação ecológica/ambiental, assunto este cada vez mais presente nas agendas políticas e na ordem do dia nacional e internacional. Este é um claro exemplo de como, a par do resto da Europa e do Mundo, a Lei tende cada vez mais a acompanhar as realidades sociais, ambientais e a evolução tecnológica e de forma cada vez mais rápida. Também a primazia do exercício físico em detrimento do sedentarismo é uma premissa a ter em conta.

No entanto, trazemos à reflexão algumas questões. Vejamos:
a) Para conduzir uma bicicleta não é necessária qualquer licença/documentação. Isto significa uma responsabilidade acrescida para os condutores de veículos a motor e demais utentes das vias;
b) Nenhum país europeu obriga as bicicletas a possuir matrícula ou seguro, pois são vistas como vulneráveis e como uma massa não causadora de danos avultados em ambiente rodoviário, ou seja, não geradoras de risco para terceiros se comparadas com veículos motorizados. No entanto coabitam e circulam lado a lado com veículos a motor;
c) Os ciclistas podem agora optar por circular nas ciclovias ou na faixa de rodagem, junto do restante trânsito;
d) Gozam da regra da prioridade à direita, deixando assim de terem de observar a cedência de passagem perante veículos a motor

Com estas novas regras, entendemos que será necessária uma grande interiorização e consciencialização dos ciclistas, pois têm de ter bem presentes os conceitos decorrentes do CE no que toca à hierarquia das prescrições (por grau de importância: ordens dos agentes fiscalizadores de trânsito, sinalização temporária, sinais luminosos, sinais verticais, marcas rodoviárias e, por último, regras gerais de trânsito), às noções de circulação em estrada e a todos os gestos previstos no CE para manobras de mudança de direção, paragem, abrandamento, entre outros. Igualmente importante é a questão da visibilidade: terão todos os ciclistas plena noção do quão importante é serem vistos pelos outros utentes das vias? E tomam essas medidas de forma consciente e permanente? Obviamente que, da parte dos automobilistas, estas premissas também têm de estar bem presentes, pois não será de todo fácil interiorizar que são eles que têm de adoptar as medidas necessárias para cumprir o artigo 18º nº 3 do CE, mesmo em vias em que atingem velocidades muito superiores às dos ciclistas. O civismo e a prudência têm de imperar e é esse o caminho a seguir.

A PSP tem alertado em diversos centros decisórios e junto das mais variadas instituições para a necessidade de uma maior aposta na educação rodoviária a peões, ciclistas (e futuros ciclistas) e condutores (e futuros condutores) nas escolas e em demais âmbitos educativos/formativos nesta questão do civismo e das regras na estrada. Os últimos estudos internacionais comprovam que cerca de 90% dos acidentes envolvendo as bicicletas têm origem nos condutores dos automóveis. Se juntarmos a estes dados o facto de as nossas principais cidades serem acidentadas (Lisboa, por exemplo, é conhecida pelas famosas 7 colinas) e não estarem estruturadas de raíz para a circulação de bicicletas (veja-se o exemplo de Amsterdão, totalmente pró-bicicletas e com severas medidas e impostos para o uso de automóveis). Paralelamente a isto, o CE português não obriga os ciclistas ao uso do capacete de protecção. Quanto à sensibilização, a PSP tem desempenhado um papel fundamental não só utilizando as suas plataformas digitais de comunicação, como também com inúmeras ações práticas de sensibilização junto da comunidade e também operações de âmbito nacional, com resultados visíveis. Mas sabemos que, na “hora da verdade”, é ao condutor do veículo que cabe a última decisão: é dele o raio de ação e a consciência na tomada de decisão.

Temos noção que há nos ciclistas, pela sua vulnerabilidade, uma certa pré-disposição para antever, evitar, contornar os perigos e daí decorrer a prudência, mas o espírito e a letra da Lei exige estas prerrogativas aos condutores de automóveis (os que possuem mais massa física e podem potencialmente causar mais danos e atingir velocidades muito superiores) no sentido de contornarem e evitarem os ciclistas com a devida distância de segurança. Cabe aos ciclistas a outra parte: interiorizar conceitos importantíssimos e regras de circulação, sem no entanto estarem obrigados a tal.

Se imperar o bom senso e o civismo, todos os utentes podem coabitar e circular nas vias em harmonia com a Lei, facto que seria em muito facilitado com uma estratégia de educação e informação nesta área, a começar nas escolas, pois a segurança rodoviária é uma responsabilidade de todos e para todos.

João Moura
Chefe do Núcleo de Protocolo, Marketing e Assessoria Técnica do Gabinete de Imprensa e Relações Públicas da PSP

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