“Poser chic”
A actual febre das motos café-racers e toda a cultura alternativa que a rodeia, maioritariamente urbana, é um fenómeno motociclístico incontornável na actualidade. “Newcomers” ou “born again bikers”, jovens ou mais “entradotes”, está a ganhar laivos de popularidade, contornando, ou mesmo contrariando, aquilo que se propunha ser: um movimento alternativo.
É, afinal, mais uma moda. Houve outras. Ligadas a alguns modelos ou tipos de moto. Não tem nada de mal. Bem pelo contrário, pois ajuda a “mexer com o negócio”, de um sector que, entre nós, bem necessitado está de ar que se respire depois de anos a viver à míngua das curtas margens das “cento e vinte e cinco”. Venham então as modas.
Esta não é, contudo, uma moda qualquer. Assenta num base cultural que ultrapassa as motos e busca raízes noutras expressões culturais, ligadas a movimentos artísticos e/ou sociais que fizeram escola no pós-guerra do século passado. Tem uma estética na música, na fotografia e no vídeo, roça outras actividades como o surf ou o skate e aponta para o revivalismo tão em voga. Fala de liberdade. Encaixa na perfeição no movimento “hipster” que hoje marca uma determinada geração, a sua pose e o seu comportamento.
As motos preferidas dos “moto-hipsters” são as neo-clássicas, ou mesmo “velharias” dos anos 1980 e 1990, tendo na Triumph Bonneville e na Honda CB “Seven-fifty”, que transformam à exaustão, as suas quintessências. Aproveitando a tendência, a BMW acaba de lançar uma jóia para entrar na luta,a a R 1200 Nine-T que, ao mesmo tempo que celebra o 90º aniversário do lançamento da primeira moto da marca, tenta captar a atenção (e o respectivo “cash”) dos adeptos da causa.
Tal como fez há década e meia atrás, com o lançamento da cruiser R 1200 C, não se poupou a esforços, contratando alguns dos mais reputados “rostos” e empresas do género para ajudar a dar o empurrão no lançamento e nas vendas. Gente que, após anos de declarações em prol da liberdade, da razão de ser diferente, da independência e distanciamento do mainstream, alegre e rapidamente se “vendeu” (ui, que palavra tão feia…) à marca germânica. Esta, inteligentemente e com o poder que se lhe reconhece, cavalga, e bem, a oportunidade.
A atitude dos “puros” acaba por não espantar. Basta, aliás, ir a um qualquer encontro do género. Têm todos a mesma aparência, deixam crescer as barbas por igual, usam os mesmos capacetes e vestem as mesmas roupas, das mesmas marcas. As camisas aos quadrados, de marca, os capacetes Ruby, caros, as botas Red Wing… todos iguais; são o contrário do que afirmam ser, diferentes. Não tardará muito para que os precurssores do movimento se comecem a afastar dele e a procurar locais, estéticos ou físicos, onde realmente possam ser diferentes e fazer diferente. Há, já, demasiados imitadores que se “mascaram” para ser aceites.
Lembram-se da tendência “custom-cruiser” de há uns anos atrás? Quando todos queriam ser “Peter Fondas” nas suas Harleys reluzentes e ouvir “Born to be Wild” a caminho do pôr do sol?… “Posers”, chamaram-lhes os que realmente tinham a cultura H-D (e os quilómetros, importa referir). Estes moto-hipsters de hoje fazem-me lembrar esse tempo. Com a diferença de que agora a moda é o… “Poser chic”.
Vitor Sousa
Assesor de comunicação