Há dias melhores
Ontem, (quando escrevi este texto) celebrou-se o Dia Internacional da Mulher. Ontem, enquanto rascunhava e deitava sucessivamente para o lixo os vários inícios desta pequena crónica, várias mulheres discursavam no Parlamento nacional a propósito das celebrações daquela efeméride.
Não irei designar essas intervenções como de “saloiada” ou de “natural” neste dia. Primeiro, porque a maioria das intervenientes não me merecem esse epíteto; depois, porque não tive a oportunidade de escutar os respetivos conteúdos (trabalho na “privada”); e, finalmente, porque o “natural” é nestas circunstâncias esmagado pela armadilha da “artificialidade”.
Na minha opinião, este mero facto comprova a hipocrisia e rusticidade vigente no nosso atual Parlamento, à semelhança de muitos outros. De resto, e com exceção de algumas civilizações, designadamente as nórdicas, dias como este não passam de umas horas e “já passa”. Bem sei que esta é a minha verdade. Cada um de nós tem a sua perspetiva, sendo essa a sua realidade. Permitam que tenha a minha também.
O Dia Internacional da Mulher (por favor, não confundir com a instituição origem-de-nós-todos “mãe”), na sua versão atual é uma data oficialmente reconhecida pela ONU desde 1977 e pretende “…celebrar as conquistas sociais, políticas e económicas das mulheres“. Na sua origem, estão lutas antigas (século XIX) pela igualdade entre géneros, no trabalho, na política e na sociedade, que muito devemos valorizar mais pelo seu real valor e não tanto pelas centenas de pessoas, designadamente mulheres, que por essa causa deram a vida, literalmente. Sendo certo que elas hoje mandam – a mãe, a sogra, a mulher, a filha ou a colega universitária –, não deixa de, em resumo, continuar a ser uma nobre causa!
Por isso mesmo, e curiosamente, no dia 19 de Novembro de cada ano, e desde 1999, passou a celebrar-se também o Dia Internacional do Homem, data oficialmente reconhecida pela ONU e pelo Estado Português (não sabiam pois não?), cujos objetivos são: “…melhorar a saúde dos homens (especialmente os mais jovens), melhorar a relação entre géneros e destacar os papéis positivos dos homens, celebrar suas conquistas e contribuições na comunidade, na famílias e no casamento, e na criação dos filhos…”. Outra nobre causa.
Na essência, a criação destes dias simbólicos na história contemporânea da humanidade pretende essencialmente homenagear e promover as lutas de minorias, ou celebrar a excecionalidade de personagens e acontecimentos. Acho bem. É o caso do dia 8 de Outubro em que se celebra o dia mundial do bigode. Contudo e antes de, mais uma vez, deitar este texto ao lixo deixem-me salientar que na minha opinião o combate pela igualdade, pela saúde, pela justiça, pelo trabalho, pela educação – enfim, por oportunidades de uma vida digna e sã, do nascimento à velhice, ultrapassa em muito os “Dia Internacional…”, com uns minutos ou horas de “bimbalhice claustrofóbica” em vários palcos mediáticos artificialmente cedidos, onde quer que se encontrem.
Valores e direitos universais, qualquer que se seja o género ou o berço, plantam-se numas gerações para germinarem nas seguintes. Plantam-se por pessoas, estadistas superiores no plano político, ético e intelectual que escasseiam no mundo civilizado moderno. Ao contrário da sua “antimatéria” (os políticos corruptos) prolífera, plantando-se através de eleições ou sem elas.
No Universo onde atualmente vivemos, as enormes minorias são a juventude sem sonhos, os meninos subnutridos ou que, à margem dos medicamentos que jogamos no lixo por esgotamento da validade, morrem quotidianamente sejam africanos, indianos, portugueses ou asiáticos, os velhotes reformados dos países periféricos ou pobres, enfim de certa forma a Humanidade! Estas Nobres Causas incluem mais de dois terços da humanidade, mas ainda não são convidadas para se fazerem ouvir naqueles palcos.
Mário Lopes