CompararComparando ...

Jack, um livro e três Carreras

Artigo
Jack, um livro e três Carreras

[doptg id=”418″]

Jack Heuer despediu-se na última edição de Baselworld. Aos 81 anos, vai-se dedicar finalmente por inteiro à família – e deixa como legado um livro sobre a sua vida, para além de três interessantes cronógrafos Carrera em edição limitada que estão agora no mercado e ainda mais dois (as duas versões Carrera CH80) que hão-de chegar mais tarde com o novo calibre de manufactura da marca fundada pelo seu bisavô…

Foi a última vez que Jack Heuer marcou presença na maior feira mundial da indústria relojoeira – um certame que ele marcou de modo histórico em 1969, quando apresentou (num consórcio com a Breitling, a Leonidas e a Breitling e em concorrência com a Zenith) o primeiro mecanismo cronográfico de corda automática. E nem era para ter estado presente; na verdade, a sua despedida estava agendada para Janeiro, num evento previsto para Genebra em que o Presidente Honorário da TAG Heuer apresentaria a sua biografia ‘The Times of My Life’ e conversaria pela última vez com a imprensa. Mas dois acidentes de esqui, um mais complicado do que o outro, debilitaram-no e frustraram essa iniciativa.

Por isso, a despedida oficial deu-se dois meses depois em Baselworld, onde voltou a ser a personalidade mais acarinhada no stand da TAG Heuer – mesmo que Stéphane Linder surgisse no certame pela primeira vez como CEO da marca fundada pelo bisavô de Jack Heuer, tendo substituído Jean-Christophe Babin. Todos queriam falar com Jack, todos se queriam despedir de Jack, todos queriam uma última fotografia com Jack. Mas nem todos puderam ter momentos de exclusividade com ele.

IMG_8429

Para mim, pessoalmente, foi mais uma vez uma honra ter estado com aquele a quem eu apelido de ‘Pai do Cronógrafo Desportivo’. Desde que Jack Heuer regressou às lides relojoeiras como Presidente Honorário da TAG Heuer, por volta de 2002, tê-lo-ei entrevistado (para a Espiral do Tempo e para a Espiral TV) umas vinte vezes e o tipo de relógios que ele preconizou no período áureo da sua marca, entre 1962 e 1978, sempre me marcou. Sempre fui um aficionado de cronógrafos com disposição bicompax, com dois totalizadores contrastantes e data às 6 horas. Dos relógios criados por Jack Heuer, também sempre fui um grande admirador do Autavia e do Monaco com essa disposição bicompax e são sobretudo esses os modelos de inspiração Heuer que tenho envergado com orgulho nos últimos 15 anos, mas entretanto houve um Carrera que não pude deixar escapar por todo o seu peso simbólico: o Carrera Jack Heuer 80º Anniversary.

De facto, Jack Heuer simbolizava – ainda simboliza – a ponte entre o passado e o futuro da TAG Heuer, e Jean-Christophe Babin (o anterior CEO) soube ir recuperá-lo à reforma (tinha vendido a marca em 1982) para fazer dele presidente honorário e até o seu pai espiritual. Foi Jack Heuer quem esteve por trás da criação dos mais famosos relógios de pulso da história da marca, tendo percorrido países e continentes para consolidar a empresa dos seus antepassados ao longo das décadas de 60 e 70 – embrenhando-se na construção do primeiro cronógrafo automático (o Calibre 11 Chronomatic, apresentado em simultâneo com o rival El Primero da Zenith em 1969) e assumindo o pioneirismo do patrocínio automobilístico ao mesmo tempo que aperfeiçoava os então incipientes sistemas de cronometragem.

No mundo da relojoaria sempre houve a tendência de fazer ressuscitar modelos do passado, sobretudo quando a relojoaria mecânica voltou a ganhar força na década de 90. A TAG Heuer esteve na linha da frente dessa prática, com o lançamento de uma fiel reedição do Heuer Carrera em 1996 (Jack esteve na apresentação, ressurgindo pela primeira vez após um longo período que se seguiu à venda da marca nos inícios da década de 80) e depois com uma feliz reinterpretação estilística do Heuer Monaco em 1998; o espírito das reedições de um pretérito glorioso foi particularmente apreciado e logo surgiram outros modelos (Monza, Targa Florio, Autavia) que não subsistiram muito tempo – só o Carrera, que evoluiu em tamanho e estilo, e o Monaco, cujas versões-base continuam próximas do original, se mantêm como traves mestras da colecção da TAG Heuer, que continua a explorar muito bem a vertente vintage com edições limitadas em que o branding Heuer é retomado.

photo14

Uma das mais recentes é um regalo para os saudosistas dos modelos dos anos 60 e 70 e deu origem a duas que surgiram posteriormente: o Carrera Calibre 17 Chronograph Jack Heuer 80th Anniversary baseia-se numa caixa contemporânea Carrera com 41 milímetros de diâmetro mas evoca o passado histórico com o tal branding Heuer, dois submostradores contrastantes com janela para a data às 6 horas e a assinatura de Jack Heuer no verso juntamente com o brasão da família fundadora e a numeração de 1 a 3.000. O contraste entre o mostrador prateado raiado, o antracite quase preto e o vermelho oferece ao relógio uma configuração desportiva e automobilística; o 80 surge destacado na escala taquimétrica. O cronógrafo é alimentado por um mecanismo automático modular (designado por Calibre 17) e está disponível com bracelete de aço ou correia de pele perfurada, embora raramente se veja com bracelete de aço porque é a de pele que mais respeita a herança histórica. O desenho e a conjugação cromática do Carrera Calibre 17 Chronograph Jack Heuer 80th Anniversary evocam o Carrera 1964 que também tem a assinatura de Jack Heuer e que foi lançado em 2005 para celebrar o 40º aniversário do Carrera – sendo mesmo considerado um dos modelos Carrera contemporâneos mais cobiçados pelos coleccionadores, para além de se inspirar no mostrador do Carrera 1153S de 1969 e de ser o relógio TAG Heuer contemporâneo preferido pela lenda viva da relojoria até ao advento do modelo comemorativo do seu 80º aniversário.

Depois surgiram mais dois cronógrafos que, nos meandros da relojoaria e entre os aficionados da TAG Heuer, passaram a ser conhecidos por Jack Heuer Carrera 81… por serem ‘filhos’ inspirados no Carrera Jack Heuer 80th Anniversary e porque foram apresentados no ano do 81º aniversário de Jack Heuer. A diferença está nas cores, na certificação de cronómetro e na ausência de assinatura.

Os dois modelos foram apresentados mais precisamente no final de 2013 e surgem finalmente agora em agentes seleccionados da marca, sobretudo nas Boutiques TAG Heuer. São evidentemente variações do modelo comemorativo desenhado e assinado pelo próprio Jack Heuer e, por tabela, acabam por ser também modelos de homenagem. Vejam aqui o trio num comparativo dos nosso colega David Chalmers, do blog Calibre 11 dedicado à Heuer e à TAG Heuer:

Com o mesmo tamanho de caixa de 41 milímetros de diâmetro (clássico para os padrões actuais), os dois novos Carrera em edição limitada apresentam um movimento cronográfico modular de corda automática com certificado COSC e por isso mesmo surge a indicação ‘Chronometer’ no mostrador que não constava no modelo Jack Heuer 80th Anniversary. A outra diferença óbvia está na combinação de cores.

IMG_0273

Enquanto o Carrera Jack Heuer 80th Anniversary apresentava um mostrador prateado com totalizadores contrastante de um antracite que chega mesmo a parecer preto, as novas edições especiais do Carrera apresentam duas variações: um com contadores e rebordo prateado sob fundo cinzento; o outro com contadores e rebordo azuis sob fundo argenté. É de destacar também, porque de grande importância estilística, a utilização do vermelho no logótipo vintage da Heuer que se encontra no mostrador e no fundo do relógio; também a correia racing em pele perfurada dos dois modelos tem o seu interior em vermelho, sendo preta no modelo de mostrador cinzento/prateado e azul na versão com mostrador prateado/azul. Essa versão particular apresenta uma combinação pictórica que é o negativo do mostrador azul ‘Steve McQueen’ do Monaco, pelo que se impunha também uma fotografia para acentuar esse pormenor:

Ao enriquecer a coleção Carrera Calibre 17 Chronograph com os dois novos modelos, a TAG Heuer proporciona aos aficionados um presente que vai eternizar o estilo de Jack Heuer. Na verdade, ainda há alguns exemplares do modelo Carrera Jack Heuer 80th Anniversary em alguns pontos de venda da marca no nosso país… e trata-se de um exemplar de elevado valor simbólico e de colecção que merece ser ‘apanhado’ antes que desapareça para sempre. Foi o que eu fiz, até porque é ‘pai’ dos outros dois e tem a assinatura do mestre. Os outros dois, os tais que são alcunhados ‘Carrera 81′, são igualmente em edição limitada e também não devem durar muito nas montras; estão somente disponíveis na Boutique TAG Heuer no El Corte Inglés de Lisboa e na nova loja Maison Torres da Torres Joalheiros na Avenida da LIberdade. Qual dos três preferem? Estou contente com o meu, tal como estou contente com a biografia de Jack devidamente autografada – e é um livro que tem muito que se lhe diga.

Para além de contar a história da marca fundada pelo bisavô Edouard Heuer em 1860, a biografia ‘The Times of My Life’ representa um sensacional documento histórico na medida em que retrata fielmente as enormes mudanças que se verificaram na indústria relojoeira ao longo das décadas – desde a vertente sociológica à do negócio puro e duro. Também revela todos os segredos por trás da criação dos modelos mais emblemáticos da marca e a parceria com vários embaixadores carismáticos (de Jo Siffert a Steve McQueen, passando por Niki Lauda), para além de incidir muito sobre a era dourada da Formula 1, quando Jack Heuer colocou o logotipo da sua marca no fato de alguns dos mais lendários pilotos do automobilismo e também nos bólides da Ferrari. Pôde ver-se isso mesmo no filme Rush; aqui está o actor austríaco Daniel Brühl no papel de Niki Lauda.

RUSH

E como este artigo já vai longo, deixamos uma abordagem mais específica aos conteúdos da biografia para uma ocasião futura – porque vale mesmo a pena, sendo que o próprio Jack exorcizou algumas más recordações ao colocar no papel a experiência traumática que foi ter de ceder a empresa/marca fundada pelos seus ancestrais durante a década de 1980, na sequência de um turbulento período duramente afectado pela chamada Crise do Quartzo. Fiquem atentos aos nossos próximos posts, porque ‘The Times of My Life’ é mesmo uma obra que vale a pena conhecer. E, para terminar, aqui ficam as imagens do novo cronógrafo Carrera CH80, inspirado numa versão Carrera tricompax (três submostradores) desenhada por Jack Heuer na década de 1960 – e dotado do novo calibre de manufactura, agora rebaptizado CH80 numa alusão à nova manufactura da marca em Chevenez e às 80 horas de reserva de corda (CH são também as iniciais internacionais da Suíça…).

Muito possivelmente, não serão as versões finais que surgirão no mercado lá mais para o final do ano; na minha opinião, deverá ser incluída uma escala taquimétrica na orla do mostrador e talvez haja um ou outro pormenor que seja afinado. Não há dúvida de que se trata um cronógrafo atraente e que exala o espírito Heuer com os seus submostradores contrastantes – mas que, para mim, não tem o appeal especial da minha disposição favorita bicompax/data às 6 horas patente no Carrera Jack Heuer 80th Anniversary e nos seus sucedâneos ‘Carrera 81′.

Texto: Miguel Seabra

Qual é a sua reação?
Excelente
0%
Adoro
0%
Gosto
0%
Razoavel
0%
Não gosto
0%
Sobre o autor
zyrgon