Kia Stinger: uma excelente surpresa a partir de €56 400
Numa época em que o sector automóvel parece cada vez mais dominado pela electrificação e pela condução autónoma, é digna de destaque a ousadia de uma marca como a Kia lançar um modelo coupé de quatro portas pensado, essencialmente, para oferecer o máximo prazer a quem o conduz – e que, por isso, é, também, o seu modelo mais performante de sempre. Concebido tendo em mente a filosofia dos verdadeiros GT, ou gran turismo (conceito que visa combinar, num mesmo automóvel, a capacidade para efectuar grandes viagens com um elevado conforto e uma inequívoca eficácia em condução desportiva), o Stinger tem ainda por missão ajudar a consolidar a imagem de marca do seu construtor, em especial na Europa, tentando aproximá-la da dos seus rivais ditos de prestígio, mormente os germânicos.
Herdeiro “espiritual” do protótipo GT Concept, revelado no Salão de Frankfurt de 2011, o Stinger é o primeiro automóvel de passageiros da Kia disponível com tracção traseira ou integral, e foi integralmente concebido e desenvolvido na Europa. O seu visual foi definido no centro de estilo da Kia em Frankfurt, onde também foi criado o GT Concept, sob a supervisão de Peter Schreyer e Gregory Guillaume – e basta um breve olhar para perceber que este é um Kia diferente dos demais.
Com 4830 mm de comprimento, 1870 mm de largura, 1400 mm de altura e uma generosa distância entre eixos de 2905 mm, as suas proporções são dignas desses históricos GT de outros tempos, a que se juntam linhas exteriores bastante cativantes e dinâmicas, em que pontificam a frente esguia, dominada pelo longo capot e pela grelha tipo “tiger nose”, uma traseira musculada e os flancos pronunciados.
O habitáculo é suficientemente espaçoso para albergar comodamente quatro ocupantes, e a capacidade da bagageira de 406 litros também convence. Mas, no interior, o que realmente surpreende é a elevada qualidade geral exibida, tanto ao nível dos materiais como da montagem e dos acabamentos, o que muito contribui para o bom ambiente vivido a bordo. E se o resultado final pode ainda não estar, nalguns detalhes, ao nível do oferecido pelos construtores do norte da Europa, também há que reconhecer que a diferença já não é tão gritante como noutros tempos.
Como, em Portugal, o Stinger só é proposto com os níveis de equipamento GT-Line e GT (dependendo dos motores), entre nós o modelo oferece sempre o volante desportivo com base plana, e os bancos desportivos com revesgumento em pele e costuras cinzentas (pele Nappa de qualidade superior nas versões GT), entre outros mimos. Num interior acolhedor, bem decorado, que oferece uma posição de condução baixa e muito correcta, uma nota para as elegantes saídas de ventilação circularas de inspiração aeronáutica.
Fazendo jus ao tal espírito GT, o Sitnger conta com motores montados em posição longitudinal dianteira, sempre combinados com a segunda geração da caixa automática de oito velocidades desenvolvida pela própria Kia, sendo a potência transmitida ao eixo posterior, ou às quatro rodas na versão de topo – a que recorre ao motor 3.3-V6 biturbo de 370 cv e 510 Nm. Da oferta faz também parte um 2.0 turbo a gasolina, com 247 cv e 353 Nm, mas a unidade motriz que realmente interessa à esmagadora maioria dos portugueses é o quatro cilindros turbodiesel de 2,2 litros, com 200 cv e 440 Nm, capaz de levar o Stinger até aos 225 km/h, e de lhe permitir cumprir os 0-100 km/h em 6,0 segundos.
E é uma vez em marcha que o Stinger conquista em definitivo mesmo os mais cépticos. Desenvolvido no célebre circuito de Nürburgring, sob a batuta de Albert Biermann (o homem que durante anos foi vice-presidente para a área de engenharia da famosa BMW M), exibe um desempenho dinâmico digno dos maiores elogios, decisivo para que, com toda a justiça, o modelo possa ser considerado um rival de propostas como o Audi A5 Sportback e, sobretudo, o BMW Série 4 GranCoupe.
A geometria e afinação das suspensões garante tanto um elevado conforto de marcha, mesmo em pisos menos perfeitos, como uma apreciável eficácia quando de impõem ritmos mais dinâmicos. A direcção de assistência eléctrica variável está bem calibrada e garante um óptimo feedback, o eixo dianteiro inscreve-se em curva com uma precisão quase abaoluta, e o trem traseiro acompanha-o com uma fidelidade digna de registo, tudo concorrendo para que os traçados mais sinuosos sejam um dos terrenos de eleição do Stinger, pelo menos para quem é adepto do prazer de conduzir.
Como se tal não bastasse, é, ainda, possível desligar o controlo de estabilidade para que, quando devidamente provocada, a tarseira rode um pouco sobre si mesma, para garantir um pouco mais de agilidade em curva. Ainda assim, de forma bastante limitada: a verdade é que a electrónica nunca se desliga totalmente, pois, assim que o ângulo de deriva é um pouco mais acentuado, o sistema intervém, repondo tudo no seu devido sítio. É um facto que, aqui, a Kia podia ter sido um pouco mais audaz, e os mais dotados não deixarão de lamentar não ser possível usufruir de uma maior deriva, mas é um progresso notória na postura da Kia neste particular, e reconheça-se que, à parte este pormenor, dinamicamente o Stinger tem tudo para pedir meças ao seu rival da BMW, o que não é um elogio de somenos…
Quanto à mecânica, o motor 2.2 turbodiesel que tivemos oportunidade de experimentar prima mais pela boa disponibilidade em todos os regimes do que pelo fulgor, pelos consumos contidos do que pela exuberância das prestações. Já a caixa de velocidades podia (e devia) ser um pouco mais lesta na resposta às solicitações do condutor, mesmo quando comandada manualmente em sequência através das patilhas no volante.
Neste particular, a boa notícia é que não deverá tardar muito para que a Kia disponibilize uma versão ainda mais aguerrida do Stinger, equipada com o motor 3.3-V6 de 370 cv, mas com potência transmitida apenas ao eixo traseiro. Não sendo aqui de colocar de lado a possibilidade de o controlo de estabilidade poder ser, efectivamente, inibido quando o condutor assim o entenda.
Tudo somado, há que sublinhar que só por mero preconceito o Kia Stinger não será reconhecido como uma digna alternativa aos modelos alemães já referidos. Claro que a realidade do mercado é bem conhecida, e a marca coreana tem ainda um longo caminho a percorrer antes de, aos olhos do público, poder ser, realmente, considerada como tal. Mas este Stinger é um óptimo passo dado nesse sentido.
Em Portugal, a versão 2.0 a gasolina está disponível apenas por encomenda (por €55 650), e o topo de gama 3.3-V6 por uns substantivos €80 150. Quanto ao 2.2 CRDi, a campanha de lançamento coloca o seu preço nos €56 400, mas neste valor se incluindo um riquíssimo equipamento de série, composto por elementos como os bancos desportivos em pele com regulação eléctrica; o sistema de som Harman Kardon; os faróis integralmente por LED com assistente de máximos; a câmara de visão panorâmica; o acesso e arranque sem chave; o sistema de navegação; o head-up display; o sistema de carregamento sem fios para smartphones; a ligação Bluetooth; e um conjunto de dispositivos de segurança em que se destacam o sistema de alerta de colisão frontal com travagem autónoma de emergência e detecção de peões; o cruise-control adaptativo; o assistente à manutenção na faixa de rodagem; o alerta de tráfego pela traseira; a monitorização do ângulo morto; e o sistema de mobitorização da atenção do condutor.