O idoso como ator no sistema rodoviário
Vem a propósito tal tema porque na passada semana foi notícia em alguns órgãos de comunicação social a par de um congresso realizado em Lisboa, precisamente, sobre esta questão.
Assim, quer pela atualidade, quer pela indiscutível importância e acuidade do tema, propus-me fazer uma abordagem simples e tão clara quanto possível, evidenciando uma das múltiplas perspetivas de aproximação a esta matéria.
Temos por certo que o sistema rodoviário é complexo e cada vez mais dinâmico, composto por atores de diferente massa e fragilidade. Neste sentido, com a última alteração ao Código da Estrada, deu-se ênfase ao conceito de “utilizador vulnerável” integrando, também, os idosos.
Este ponto de partida é essencial para determinar redobrados cuidados na interacção com este grupo de risco, já há algum tempo detetado como tal, que se afere pela percentagem de vítimas por acidente de viação entre os idosos peões e condutores.
Com a idade existem alterações nas capacidades físicas e psicomotoras que se reflectem na forma como se está no ambiente rodoviário seja qual for a qualidade que se assuma, peão ou condutor, sobretudo na segurança das deslocações em que se torna notória a influência de uma certa vulnerabilidade pois, reduzindo-se a mobilidade, a percepção e o tempo de resposta face a certo perigo ou ameaça, aumenta proporcionalmente o risco.
O sistema rodoviário pressupõe a compreensão de informação e de representações, que decresce com o aumento da vulnerabilidade que os humanos experimentam no processo de envelhecimento. A par disto devemos colocar em discussão a questão relacionada com as infra estruturas, a sinalética e a informação rodoviárias e a respetiva conexão com este grupo de risco. Estarão adaptadas?- Fazem essa previsão?- A via é auto-explicativa e simples?
O que nos diz um estudo a que tivemos acesso, feito num país do norte da Europa há cerca de dois anos, cujo público em análise foi precisamente pessoas com mais de 75 anos é que:
a. Cerca de 92 por cento já não conduziam de noite,
b. Cerca de 88 por cento já não conduziam para o centro das cidades,
c. Cerca de 86 por cento já não conduziam para áreas desconhecidas,
d. Em média faziam percursos de cerca de 23 km’s e/ou com a duração média de cerca de 40 minutos.
e. Cerca de 94 por cento não conduziam com condições atmosféricas adversas.
Depreende-se que há uma auto consciência das limitações impostas pelo processo natural de envelhecimento e que existe uma certa capacidade de auto preservação, no limite o deixar de conduzir resulta de uma decisão muito própria.
Como é certo que a hipótese de se deixar de conduzir será sempre percepcionada como uma diminuição de liberdade de movimentos, de qualidade de vida em certa medida e num aumento de dependência a que o ser humano é avesso.
Sabe-se que a revalidação do título de condução é um processo que carece da adequada certificação das capacidades físicas e psicológicas por via de exame médico obrigatório, sendo que, com o aumento da idade, submete-se a períodos menores, em que a partir dos 70 anos de idade passa a ser de dois em dois anos. Para o exercício da condução de transportes públicos de passageiros a idade limite é de 65 anos de idade.
Muito mais haveria a escrever sobre este tema. Neste momento importa, sobretudo, identificar as carências do próprio sistema rodoviário que, providas, tornariam esse sistema mais amigável para este grupo de risco, fazer uma campanha dirigida a todos que, por um lado sensibilize para esta realidade e, por outro lado, faça um claro apelo de solidariedade e entreajuda, como em tempos se dizia, numa campanha de razoável sucesso – “dê mais tempo a quem precisa”.