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Os preços de referência: como se estabelecem? Para que servem?

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Os preços de referência: como se estabelecem? Para que servem?

Sempre tive alguma dificuldade em lidar com situações ambíguas, principalmente quando não consigo vislumbrar a razão das mesmas. Vem isto a propósito da anunciada intenção do Governo em criar preços de referência para os combustíveis rodoviários. Tratando-se de um mercado há muito liberalizado e onde existe um número significativo de atores de dimensões e características diversas, não consigo descortinar a necessidade da sua criação. O Governo, se não acredita que os mercados funcionam corretamente (para que serve, então a Autoridade da Concorrência?), tem sempre a prorrogativa de os regular. Então porque não o faz e escolhe a opção de criar valores de referência? Nunca ouvi explicações convincentes sobre esta opção. São populares? Sem dúvida, principalmente quando se afirma que elas deverão induzir a uma baixa de preços. E é aqui que surge a pergunta: mas porquê esta suposição? E que nos leva a outra questão: como é que são estabelecidos?

Ao contrário do que se pretende fazer crer com algumas afirmações, os preços dos combustíveis rodoviários em Portugal não estão inflacionados. Expurgados da carga fiscal eles estão muito em linha com os praticados na zona euro, apesar desta comparação ter que ser feita com algum cuidado, como a própria Comissão Europeia refere, pela simples razão que não existe um sistema estandardizado de reporte dos preços nos países, e a composição dos produtos variar em função da percentagem de biocombustíveis que é incorporada e que varia de país para país. Mas, apesar de tudo, é uma comparação credível e que mostra que o comportamento dos preços em Portugal não diverge. A acrescentar a este facto, a concorrência e as estratégias comerciais dos vários operadores tem vindo crescentemente a proporcionar aos consumidores uma panóplia de escolhas, permitindo-lhes obter descontos e outras promoções em praticamente todos os pontos de venda. Há ainda a referir a divulgação diária, pela Direção Geral de Energia e Geologia, dos preços praticados na maioria dos Postos de Combustíveis em Portugal Continental (nas regiões autónimas da Madeira e dos Açores os preços são regulados) permitindo aos consumidores, que o desejarem, terem informação detalhada sobre os preços na sua área de residência ou ao longo do percurso que têm planeado.

Outras afirmações recorrentes e, aparentemente contraditórias, são as de que os preços são todos iguais, citando-se o que acontece em determinados troços de autoestrada como exemplo, ou pelo contrário que existem diferenças significativas. Afinal o problema reside nos “preços serem todos iguais” ou em “haver diferenças significativas”? Em que ficamos? A minha resposta é simples: são as leis do mercado que ditam que isso aconteça e em nada é diferente do que se passa com muitos outros produtos de grande consumo, sejam eles alimentos, vestuário, eletrodomésticos, mobiliário e um sem número de outros produtos em que não identificamos razões imediatas para todas as diferenças de preços praticados: Será que o Governo vai também criar preços de referência para todos os bens ou, pelo menos, para os de maior consumo e de primeira necessidade?

Bem, e agora a tal segunda questão: como vão ser definidos? Qual a certeza que traduzirão melhor uma justa repartição de custos e benefícios entre comercializadores e consumidores do que o atual funcionamento do mercado? Não basta dizer que serão ouvidas todas as partes, é necessário que o (indesejável) sistema esteja assente em dados fiáveis, critérios credíveis e não apenas em perceções que, infelizmente, parece ser o que está na origem destas iniciativas.

Uma palavra final para dizer que achamos perfeitamente louvável a preocupação do Governo em querer baixar os preços aos consumidores. Mas talvez também deva ser função desse mesmo Governo preocupar-se com a saúde das empresas e da economia. É que sem elas não há investimento, criação de riqueza, emprego, receita fiscal e podemos estar perante um aparente benefício que a prazo se voltará contra todos.

António Comprido
Secretário-geral da APETRO

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