Reflexões sobre duas rodas
Agora que (aparentemente) a chuva foi embora e o tempo bom chegou, também as motos que estiveram abrigadas da chuva voltaram à estrada. E se por um lado a chuva e vento tiram muita da diversão de andar de moto, por outro lado (pelo menos a mim) forçam qualquer motociclista a ter muito mais noção do perigo que nos rodeia a cada instante. Queria aproveitar para partilhar umas quantas reflexões:
Vestuário de protecção
É assustadora a quantidade de motociclistas que vejo a circular que aparentemente consideram que a única parte do seu corpo que merece protecção é a cabeça, e mesmo assim suspeito que só usam capacete porque é obrigatório. É uma daquelas verdades muitas vezes ditas em relação a andar de moto, que a questão que se deve colocar não é se se vai cair, mas quando. A inevitabilidade de um encontro com o alcatrão promovido pela gravidade e todas as restantes leis da física deveria ser suficiente para que qualquer motociclista tomasse um mínimo de atenção ao seu equipamento. Eu que o diga, que este Inverno experimentei (pela segunda vez) essa sensação de impotência quando percebemos que o chão é o destino. Devo relatar que graças a luvas, casaco e botas, a única coisa que ficou ferida foi o orgulho (e a conta bancária), mas não fora pelas protecções ainda hoje estaria a tirar areia da pele. O argumento de que está muito calor não pega, é perfeitamente possível comprar casacos leves e luvas ventiladas que em nada limitam o arrefecimento. E nada estraga mais rapidamente um dia de praia que deixar o bronze no alcatrão.
Cortesia dos condutores
Uma das maiores vantagens de andar de moto é a possibilidade de circular mesmo quando o restante trânsito está parado. Especialmente em cidade, ser sempre o primeiro da fila no semáforo reduz muito o tempo de viagem. Mas é preciso ter em mente que circular entre as filas de carros parados não é um direito. De cada vez que um carro se desvia para deixar passar um motociclista está simplesmente a ser cortês e merece definitivamente um agradecimento. Já circular a alta velocidade entre as filas de carros, esperando que todos se desviem, é, mais uma vez, estar a tentar a sorte. Uma das melhores maneiras de nos protegermos é assumirmos que todos os automobilistas nos querem matar. Ou, posto de outra maneira, que somos invisíveis. Isto significa que, quando um automóvel subitamente muda de faixa, não quer dizer que fosse sua intenção abalroar o motociclista, Sendo muito mais provável que, simplesmente, não o tenha visto. Se estava ao telefone ou a mudar a estação de rádio é irrelevante depois de já estarmos no chão. Aos automobilistas deixo um pedido: sinalizem SEMPRE a manobra, pois se há coisa a que um motociclista está atento é aos piscas.
Escapes de rendimento
Há quem argumente que dão mais potência (questionável sem alterações profundas em todo o motor), ou até que são um mecanismo de protecção do motociclista, pois sinalizam aos automobilistas que vem lá uma moto (como se as motos devessem ter algum tipo de prioridade). Não vou nessa. Um escape ruidoso não é mais que poluição sonora e uma falta de respeito para com os outros utentes da via. E se no caso de uma Ducati (ou de uma Honda CBX) até posso dar o desconto (se bem que andar sempre com aquela barulheira vai acabar por dar cabo da audição), já no caso da moda mais recente das scooters com escape alterado, sempre que vejo (ouço?) uma passar, só me vem à mente uma coisa.
Gonçalo Gonçalves
Coordenador do laboratório de veículos e propulsão do DEM-IST