Risco nas estradas: o papel do género na segurança rodoviária
Gostaria hoje de me focar num assunto que creio ser de especial interesse no que à segurança rodoviária diz respeito – a mortalidade nas estradas e a sua relação com o género.
É sabido que o homem, muito mais que a mulher, tem comportamentos menos adequados ao volante, fruto de (entre outros) maior agressividade na condução. Utilizo o adjetivo “agressividade” precisamente por acreditar que ele define ou caracteriza em boa parte o que vou passar a expor.
Na atual União Europeia (UE) considerando os seus 27 Estados Membros e com base nos dados estatísticos de 2011, podemos afirmar que mais de 30.400 pessoas morreram nas estradas em consequência de colisões/acidentes rodoviários. Deste impressionante número, cerca de 23.200 vítimas correspondiam ao género masculino, enquanto “apenas” um terço deste número respeitava ao género feminino, ou seja, 7.200 vítimas mortais.
Esta diferença substancial entre vítimas masculinas e femininas deve-se a vários fatores, sendo de não desprezar o facto de haver mais homens encartados do que mulheres. Ainda assim, o rácio não é nos dias que correm de três vezes superior nos homens. Na verdade, existe hoje quase o mesmo número de jovens condutores masculinos e femininos encartados. Mas porque é que me refiro aos jovens e não a todos os outros condutores? Simplesmente porque a classe etária com maiores índices de mortalidade é a dos condutores jovens (até aos 24 anos, inclusive).
Apesar das mulheres representarem cerca de 51% da população europeia, apenas são “responsáveis” por 24% das mortes nas estradas, deixando a restante percentagem (76%) para os homens. Por ano, e por cada milhão de habitantes, 95 homens morrem nas estradas da UE, comparando com 28 mulheres na mesma escala.
Segundo dados da Organização Mundial de Saúde cerca de 1,2 milhões de pessoas morrem todos os anos nas estradas e mais de 50 milhões ficam gravemente feridas, sendo que neste universo (mundial) não existem dados referentes à tipologia do género mas ainda assim, diria que bem mais de 50% serão certamente indivíduos do sexo masculino.
De acordo com o relatório “Flash 25” da ETSC- European Transport Safety Council, os indivíduos do sexo masculino têm uma muito maior propensão para o acidente do que os do género feminino, daí a ocorrência posterior de maior mortalidade nos homens. Esta diferença deve-se, essencialmente, ao tipo de condução e consequentemente à maior exposição ao risco por parte destes condutores.
Fatores associados aos comportamentos de risco, já de si mais elevados nos homens do que nas mulheres são o consumo de álcool, drogas e outras substâncias que, juntos, acabam por conduzir àquela situação. As mulheres, em geral, têm comportamentos mais sãos e responsáveis ao volante. O estereótipo de que são “azelhas” reflete-se, na verdade, numa condução mais cuidada e suave, logo muito mais consciente e segura.
Ainda de acordo com aquele relatório, e hipoteticamente, se todos os utilizadores das estradas da UE fossem mulheres a taxa de mortalidade rodoviária europeia seria cerca de 20% mais baixa do que a média. Um outro dado curioso é o facto de grande parte dos homens morrerem em consequência de acidentes como condutores de automóveis e motociclos, enquanto as mulheres serem alvo de acidentes como peões ou como passageiras de automóveis e não como condutoras.
De acordo com o mesmo relatório, a educação (sensibilização) para a segurança rodoviária tem vindo a aumentar desde 2001, com reflexos positivos alcançados no final da primeira década deste século e com consequência nos dados de sinistralidade obtidos já nos primeiros anos desta segunda década.
Apesar desta evolução significativa face às décadas precedentes, podemos dizer que entre 2001 e 2011, morreram cerca de 358.000 homens e 113.000 mulheres nas estradas europeias. Este número dá muito que pensar, não só pela dimensão terrível de dano social como também das consequências económicas associadas.
De forma a combater esta terrível chacina, há que apostar fortemente na educação das crianças (futuros condutores, passageiros e peões), sendo que o ensino escolar é determinante para a passagem de conhecimentos e sensibilização dos futuros condutores. As meninas são mais sensíveis a estes problemas e pela sua postura mais madura, adotam aquando na entrada na maioridade, comportamentos mais adequados e sensatos à prática rodoviária, seja como futuras condutoras ou como peões.
As campanhas de segurança rodoviária parecem também ter um papel determinante para a sensibilização e alteração comportamental, ainda assim, a taxa de mortalidade entre os jovens principalmente do sexo masculino continua a ser muito elevada e preocupante, pois estes parecem demonstrar maior propensão para os comportamentos de risco associados.
Não querendo alongar-me neste texto, diria que, de acordo com o relatório europeu citado, os três principais fatores de risco associados à mortalidade continuam a ser a velocidade, a condução sob efeito do álcool e o não uso do cinto de segurança.
É neste sentido e conhecendo as causas dos problemas que deverão os Estados de per si, bem como as organizações políticas europeias atuar no sentido de legislar proactivamente a favor e em defesa dos cidadãos, criando condições que facultem melhores acessibilidades (peões), melhores dispositivos de segurança rodoviária nos veículos, reforçando a segurança passiva e ativa destes e promovendo assim níveis de confiança maiores nos condutores, passageiros e peões.
Só com políticas verdadeiramente direcionadas e focalizadas para os cidadãos, poderemos ver baixar os números incrivelmente elevados que ainda hoje assombram na União Europeia e no nosso país em particular, apesar do esforço e da evolução positiva que temos vindo a registar nestas duas últimas décadas.
Diogo Júdice
ANSR