A segurança passiva do automóvel
Gostaria hoje de desenvolver uma questão de grande importância, muitas vezes menosprezada, esquecida ou simplesmente ignorada por muitos compradores singulares e/ou coletivos no ato da aquisição de um veículo – a segurança do seu automóvel.
Na verdade, muitos de nós quando equacionam a compra de um automóvel, novo ou usado, não estabelecemos como prioridade o importantíssimo fator segurança, ou quando simplesmente fazemo-lo, não a consideramos como o principal requisito para a sua aquisição.
Ora é pois com esta preocupação que escrevo estas linhas. Na realidade, a segurança automóvel tem vindo a ser encarada pela indústria automóvel moderna como um desígnio, sendo que o desenvolvimento de testes de segurança passiva e ativa já há muito que é tido como uma prioridade daquela indústria.
Sendo um dos pilares da segurança rodoviária a componente automóvel, não será certamente displicente referir que na última década, designadamente entre 2004 e 2013, as vítimas mortais terem descido em 54%, os feridos graves em 51% e os leves em 23%. Na verdade, os automóveis são cada vez mais seguros e, consequentemente, mais vidas são salvas diariamente.
Desde os primórdios que “as marcas” se dedicam à segurança dos veículos por si comercializados. Desde a fase de projeto até à conceção, a segurança é (cada vez mais) uma preocupação patente em todos os fabricantes de automóveis. É por esta razão que são investidos anualmente milhões de euros em investigação, desenvolvimento e conceção de novos produtos.
Hoje, mais do que nunca, a segurança é um fator de vendas e, conscientes dessa realidade, as marcas apostam tudo nesta área. Aos poucos a sociedade vai-se consciencializando da necessidade e importância dos dispositivos de segurança passiva e ativa. Mas afinal que dispositivos são esses? E o que é que eles “fazem”?
Hoje debruçamo-nos sobre a questão da segurança passiva, ficando desde já prometida numa próxima edição abordarmos a questão da segurança ativa. A segurança ativa é aquela que atua na condução com vista à prevenção do acidente, enquanto a segurança passiva é a que atua de forma direta na proteção dos ocupantes em caso de acidente.
Como é de todos sabido, o veículo e o organismo humano estão sujeitos às leis da Física aquando de um embate (acidente), sendo que, ambos estão sujeitos a variação de forças e como tal sujeitos a acelerações e desacelerações. Com vista a minimizar estas forças, capazes de causar danos corporais graves e/ou até mortais nos ocupantes dos veículos, foram desenvolvidos sistemas primários e secundários que têm por objetivo dirimir as consequências de tais lesões. Falamos então de zonas de deformação programada (estrutural), cintos de segurança, airbags e encostos de cabeça, entre outros.
Estes sistemas de segurança passiva, apelidados como sistemas de retenção, são atualmente obrigatórios por lei, em muito contribuindo para a redução da sinistralidade rodoviária, a qual, tem vindo a decrescer significativamente quer no nosso país, quer a nível europeu.
Mas passemos desde já aos sistemas propriamente ditos.
O principal, é sem dúvida o cinto de segurança. Na verdade, este dispositivo de retenção, retém o corpo em situação de aceleração e/ou desaceleração, impedindo que o corpo saia da sua posição sobre o assento.
Assim, este dispositivo faz com que o corpo acelere e/ou desacelere juntamente com a massa do veículo, em qualquer situação, seja numa travagem brusca, colisão ou durante uma simples curva atuando como força centrípeta no corpo dos ocupantes de um veículo.
Desta forma, o cinto de segurança proporciona, ainda, em caso de embate, a “defesa” do corpo humano contra qualquer superfície sólida do interior da carroçaria, por exemplo, volante e/ou tablier, diminuindo o risco de lesões graves ou mesmo evitando a morte dos ocupantes do veículo. Relembre-se que de acordo com o Artigo 82.º do Código da Estrada, a sua utilização é obrigatória, sempre que os veículos estejam equipados com estes dispositivos (tanto à frente como atrás), sendo que quem não utilizar, ou utilizar incorretamente os dispositivos de segurança, é sancionado com coima de €120 a €600.
Um outro importante dispositivo é o encosto de cabeça. Se atualmente o seu uso é generalizado, há umas décadas atrás o mesmo não era obrigatório, tal como o cinto de segurança. Este dispositivo, ao contrário daquilo que muito pensam ser – um dispositivo estético e de conforto – é na realidade um elemento de grande importância, pois o mesmo, evita o chamado “golpe de coelho” ou seja a “chicotada” sofrida aquando de uma colisão traseira e/ou lateral.
O “golpe de coelho” continua a ser um dos fatores gerador de lesão cervical ou lombar (que pode ser mortal) provocando a desarticulação ou pura e simplesmente destruição de vértebras, desagregando-as, destroçando-as e podendo assim até provocar o esmagamento da própria medula espinal. É com esta preocupação que desde 2008 o organismo europeu independente Euro NCAP (European New Car AssessmentProgramme) avalia os assentos por forma a impulsionar o desenvolvimento de novos e mais sofisticados encostos de cabeça.
Esta entidade procede à avaliação da segurança de automóveis novos, em cada segmento, com base nos seus testes de segurança. É verdade que por requisitos legais, todos os modelos de automóveis novos devem passar por testes de segurança antes de serem comercializados, mas a legislação fornece (apenas) um padrão mínimo legal de segurança para os carros novos, sendo que é objetivo do Euro NCAP incentivar os fabricantes a excederem os requisitos mínimos exigidos, indo mais longe e, assegurando assim maiores níveis de segurança aos produtos (veículos) por eles criados.
Outros dispositivos em uso atual nos veículos são os pré-tensores, os quais se traduzem num sistema de acréscimo, em termos de segurança passiva, aos cintos de segurança. Estes funcionam em caso de colisão, reduzindo instantaneamente a folga formada entre a correia do cinto e o corpo do ocupante. O princípio de ação da maioria dos pré-tensores baseia-se num sistema pirotécnico que atua imediatamente após a colisão, sendo a sua ação determinada pela intensidade do choque.
Mas de todos os sistemas atualmente mais em voga são os célebres “sacos de ar” vulgarmente apelidados de airbags, que inicialmente eram apenas colocados no volante do condutor, sendo que atualmente são aplicados nas mais diversas partes do habitáculo. Hoje existem veículos de série equipados, para além dos normais airbags frontais, com airbags laterais, de cortina e até de joelho.
Este dispositivo atua apenas e só após a colisão, sendo que o princípio de funcionamento é o de uma almofada de ar cujo enchimento, realizado por ação pirotécnica, é efetuado a grande velocidade (aprox. 90m/s). Na verdade, o airbag ao contrário do que muitos pensam, não substitui o adequado uso do cinto de segurança, tão só o complementa, protegendo a parte superior do tronco do condutor e passageiros.
Atualmente já existem carros com airbags acoplados aos bancos da frente para que, em associação aos cintos de segurança traseiros, possam proteger da forma mais eficaz possível os ocupantes dos bancos traseiros. Os airbags estão programados para dispararem só em velocidades superiores (médias) a 23km/s, sendo que abaixo desse valor não se justifica a sua entrada em ação.
Os veículos modernos estão equipados com as chamadas zonas de deformação progressiva ou deformação estrutural programada, composta pelo conjunto chassis/carroçaria. A estrutura dos novos veículos é constituída por materiais cada vez mais flexíveis e deformáveis, permitindo a absorção máxima de energia cinética no momento da colisão e, consequentemente, transmitindo menos energia para o interior do habitáculo, aumentando a probabilidade de sobrevivência dos ocupantes do veículo.
A aposta tem vindo a ser na utilização de novas ligas leves de alumínio, bem como dos polímeros (plásticos). Mas a maior proteção advém dos compostos de materiais de alta-resistência, posicionados em zonas críticas da estrutura, tais como ligas de aço-boro que garantem a integridade básica da carroçaria e evitam a entrada de materiais sólidos para o interior do habitáculo do veículo suscetíveis de causar ferimentos aos seus ocupantes.
O objetivo, em termos de segurança passiva, das estruturas de conceção moderna dos automóveis é garantir o espaço de sobrevivência no habitáculo, a chamada “célula de segurança”, e, assim, promover a absorção eficiente da energia cinética presente nos veículos em movimento, no momento da colisão.
Portanto se algum dia comprar um veículo novo ou usado, informe-se sobre as suas características e dispositivos de segurança, sendo que pode sempre consultar o site do já acima mencionado Euro NCAP (http://www.euroncap.com/home.aspx) e assim fazer uma escolha mais acertada e… segura!
Diogo Júdice
Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária