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A armadilha da pobreza

Artigo
A armadilha da pobreza

Era uma vez um povo que gostava de viver dos rendimentos e dos subsídios. Um povo que vendia e arrendava terras, aquelas herdadas dos seus avós e pais, a estrangeiros para estes criarem explorações agrícolas, de produtos antes dados ao porco ou enterrados e por aqueles agora exportados constituindo fontes de riqueza.

Esse povo entretinha-se em intrigas e a discutir como aqueles usavam as “suas” terras e as “suas” máquinas, conjugadamente com as favoráveis e únicas condições climatéricas. Proferindo desculpas, era com não surda inveja que esse povo assistia, desde as filas do IEFP, à invasão de milhares de trabalhadores de distantes origens como vietnamitas, filipinos, búlgaros ou romenos que “lhes vinham roubar o emprego”. Garantidos por outros, aquele povo esperava por mais um subsídio, por exemplo daqueles dados para nada se cultivar e, caso se tenha, conseguir arrendar mais uns acres da terra herdada ou, simplesmente, mais um novo empréstimo. Esse povo tem cultivado e apenas colhido, miséria.

Foi assim, a observar esta realidade que passei os últimos dias numa viagem profissional pelo Alentejo. À porta do IEFP, numa cidade alentejana, as pessoas amontoavam-se e, logo após alguns quilómetros, milhares de asiáticos e europeus (do Leste e, até, de Espanha) a trabalharem os campos e a transformarem alguns dos produtos germinados naquelas terras, transportados em dezenas de camiões TIR para o Norte.

Campos esses que hoje são propriedade, ou simplesmente terra arrendada, de alemães, finlandeses, americanos e espanhóis; e que anteriormente pertenciam a inábeis e, eventualmente, preguiçosos proprietários portugueses. Com a mesma maquinaria agora pintada, melhorada e adaptada a outro ritmo, a dos mercados exigentes com o produto e a data de entrega. Em algumas daquelas explorações visitadas não me cruzei com um português sequer!

Batata-doce (outrora deitada aos porcos ou enterrada), cenoura, couve chinesa, couve-flor, mirtilos, framboesa, morangos e amoras entre outras produções. Exportações para os países do norte onde, durante o inverno, a respetiva produção é impossível pelas condições climatéricas adversas.

Nada tenho contra o investimento estrangeiro em Portugal, antes pelo contrário. Fico, no entanto, triste por constatar que esse investimento em pouco contribui para a melhoria da vida económica, social e cultural das pessoas locais, em grande medida por responsabilidade delas, mas também em muito da chamada política social de “subsídiodependência” criada na Europa. Afinal, esta é uma praga que tem viciado povos menos instruídos, e, por isso, menos autónomos.

Este é um mal de economias como a portuguesa, grega e italiana, mas também dos grandes países como a França ou o Reino Unido, onde é mais cómodo para os governos pagar do que incentivar a atividade reprodutiva e o trabalho intelectual ou físico como geradores de riqueza, para os seus cidadãos em geral. O plano Draghi poderá dar alguma ajuda, mas não fará milagres. No Alentejo, como na restante Europa, só o empreendedorismo sobre novas e boas ideias, o trabalho e o correto financiamento desses projetos poderão recolocá-los no patamar de desenvolvimento que ambicionamos e que a história lhes tem concedido.

Mário Lopes
VINCO – Consultoria, Gestão e Investimentos, SA

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