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Um português na Volvo Ocean Race: a aventura no Mapfre

Artigo
Um português na Volvo Ocean Race: a aventura no Mapfre

Gostava de explicar um pouco, e antes de começar, a razão pela qual tomámos uma opção diferente de todos os outros barcos quando estávamos a liderar a segunda etapa. Digo isto porque têm sido tantas as perguntas a esse respeito que é justo uma pequena explicação, embora não a possa dar na totalidade, por várias razões, talvez mais tarde a conclua….

Em todas as etapas, há uma programação de rumo/meteorologia que nos dá várias opções para chegar ao destino, de acordo com as previsões para os dias de navegação que se seguem. Cerca de 99% das nossas previsões davam uma melhor média de vento, apesar de termos que navegar mais de 230 mn (aproximadamente) que a rota directa. Esta, embora mais curta, não nos dava em nenhuma das opções bom vento, e o tempo que iríamos ficar quase parados justificava o “desvio” em busca de melhor vento.

Outra das coisas que não ajudou foi o facto haver uma distância bastante significativa para o segundo barco – além do contacto visual, estes dois pontos fizeram com que se tivesse de tomar uma decisão rápida, porque eles podiam tomar esta opção e, como estavam mais atrasados, a previsão de apanharem mais vento era grande, e assim fomos nós, sem saber o que os outros iriam fazer. Convém referir que em casa a “malta” tem mais informação sobre os outros barcos que as próprias equipas, que só recebem o posicionamento de cinco em cinco horas. Por isso, quando o recebemos e percebemos que estávamos sós a ir para Este, já era tarde, não tivemos o vento esperado e já estávamos 40 mn atrá… Posto isto, só nos restava esperar que estivéssemos certos. Foi sempre a perder e sem forma de recuperar depois da opção.

Entretanto, recuperámos um pouco para o Alvimedica – apesar de ter parado cerca de oito horas para ajudar o Vestas, conseguimos aproximar-nos e passá-lo. Isto acontece porque o vento não é igual em todo o oceano, e tal faz com que haja a possibilidade de um barco atrasado conseguir recuperar em muitos dos casos.

Havia rumores de que teríamos de ficar à frente dele, no mínimo, o tempo que esteve parado, e teria que ser compensado, mas as regras são claras, e um barco que preste auxílio a outro só terá direito a beneficiar desse tempo perdido caso tenha perdido posições, o que não foi o caso. O Alvimedica estava em 6º quando mudou de rumo para prestar auxílio, este é o motivo pelo qual o pedido de reparação não deverá ser aceite no próximo dia 30, quando os vários protestos se decidem.

Já estava o barco no cais e a postos para uma profunda intervenção técnica, após um intenso dia de trabalho, que começou às 08:30 com o formalismo junto das autoridades locais, e às 17:00 estávamos prontos para começar o processo de retirar mastro e o barco de dentro da água. Mas a chegada a terra foi suficiente para concluir que 25 dias no mar não dão para testar algumas soluções – montámos novamente o barco durante a noite e fomos navegar de madrugada ainda bem escuro, o que deu para verificar alguns detalhes, e às 08:00 estávamos novamente na grua prontos a subir o barco.

Neste momento, vários barcos estão a cumprir o plano de manutenção, mas nós não, estamos um pouco (bastante) atrasados… Durante os dias em que o barco está terra, duas equipas inspeccionam o barco, mastro, lemes, etc. Tudo passado a pente fino com ultra-sons, para termos 100% de certeza que tudo está em perfeito estado.

Como fomos o 4º barco a chegar, fomos o 4º barco a receber a inspecção; e como cada inspeção demora um dia completo, recebemos a notícia menos boa de que foram encontradas duas áreas deslaminadas no mastro, com cerca de 53 cm e 27 cm respectivamente. Eu, como responsável do mastro, passei os meus olhos por cada peça, cada bocadinho do mastro, mas era praticamente impossível ter visto este problema, que só com estes “sensores” são identificáveis. Mas podia ser muito maior se não se tivesse encontrado aqui, temos muito mais trabalho, mas o barco larga em condições para uma das etapas com mais tempo de navegação à bolina…

Não fomos o único. Além do problema com o barco chinês que todos viram, o SCA, que recebeu um mastro novo em Alicante, tem o mesmo problema que nós, embora com menor dimensão. Neste momento, todos os mastros estão praticamente prontos para ser montados, excepto o nosso. Aproveitamos para reforçar, lixar, laminar e colar peias no interior do mastro – todas as peças foram retiradas, rolamentos, pins, cabos, etc, etc.…

Este problema está a surgir devido ao facto de as velas (monótipo) serem muito “gordas”, e haver a necessidade de curvar o mastro ao máximo para aplanar a vela. Com isto o mastro está a trabalhar fora das curvaturas “normais” e seguras para as quais foi projectado e construído. Há uma “guerra” grande entre a North Sails, fabricante das velas, e a Southern Spars, fabricante do mastro, e as próprias equipas, que não chegam a entendimento sobre a curvatura da vela. Além de tudo isto, existe também uma grande possibilidade de as velas não serem completamente iguais, embora já tenham sido rectificadas em Alicante antes da saída…

Há protestos em cima da mesa, e vão ser conhecidas as decisões nos próximos dias, as quais dizem respeito ao que anteriormente mencionei. Todas as equipas têm um número máximo de velas que podem ser escolhidas consoante a opção táctica, mais um A3, um J2, um J1, etc. De início, as opções de velas foram feitas com base nestas regras (uma vez que a regra diz que nenhuma vela pode ser alterada, reparada pela própria equipa, e que não haverá alterações), cada equipa fez a sua selecção de velas para a Volvo completa e, neste momento, devido ao erro, talvez de construção, já houve em Cape Town alteração na J1 e agora na J2. Isto está a contrariar a regra, e como algumas equipas apostaram nessas velas, uma vez que conheceram o barco antes da regata se iniciar, e identificaram atempadamente o problema, agora, caso todas as equipas recebam ajuda para rectificar estas velas, a equipa que apostou em ter uma outra dessas velas para trocar não tirará proveito da aposta que fez.

Vai dar que falar, já esta a dar e a malta já se sente nervosa. Vamos ver como corre isto, e as decisões que vão ser tomadas.

Vamos fazer com que a nossa “prendinha” de Natal seja encontrar todos os problemas existentes agora, e terminar tudo a tempo para a largada dia 3. Todas as peças saíram do barco – molinetes, bases, sistemas hidráulicos, etc. Há muito a fazer ainda, mas aqui o tempo quentinho ajuda um pouco.

Um abraço a todos do “ deserto” de prédios gigantes.

Até já!

Renato Conde
Membro da equipa de terra do barco espanhol Mapfre

(Texto escrito antes da largada para a terceira etapa da Volvo Ocean Race que liga Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, e a cidade chinesa de Sanya)

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LX Sailing